terça-feira, 22 de junho de 2010

A Cidade e os Olhos

Por Débora Scaldelai

Na cidade de Débora, o que se vê são seus habitantes com olhos de tamanhos diferentes. São duas tribos, uma de olhos muito grandes, e outra com olhos bem pequenos. Quando se está no alto, na janela dos prédios – que são, na sua grande maioria, baixos e coloridos - é possível ver a tribo de olhos pequenos: eles seguram grandes tacos, fazendo treinos de jogos que fazem parte da cultura de outras cidades, mas não de Débora. Quando se está caminhando pelas ruas de paralelepípedos, vemos a tribo de olhos grandes, gritando para conversar com quem está em cima, nas janelas, e da mesma maneira, quem está nas janelas, responde para está em baixo nas ruas de paralelepípedos gritando muito alto.
A cidade é cortada por um rio que vira mar a cada novo mês, formando duas praias de concreto, uma de cada lado. Quando isso acontece, param os treinos e as conversas e fazem todos os olhos, grandes e pequenos, se fecharem por algum tempo. Percebemos que tudo fica mais introspectivo e cinza. Nesse momento se separam os habitantes. Os de olhos pequenos vão para a praia do lado esquerdo, e os habitantes de olhos grandes ficam na praia do lado direito (o direito e esquerdo é a perspectiva de quem olha para o campo de treino). Esse dia dura 48 horas.



Quando o rio volta a se formar, tudo volta ao normal, o treino e as conversas. O mais interessante é que, mesmo que os olhos sejam todos da mesma cidade, dentro do campo se forma a cidade que treina e não está no dia a dia da cidade que grita e vice versa. O único momento em que todos compartilham as mesmas sensações é o dia em que o rio vira mar. Mesmo que ainda assim estejam separados, o dia é encarado da mesma maneira e temos um dia de harmonia onde ambas as tribos pensam num futuro.



Os olhos grandes olham para um futuro bem ali, os olhos pequenos só imaginam um mar de verdade para atravessar do outro lado e construírem seu futuro em outra cidade bem longe dali. O que fica de semelhança é um sonho. O de nadarem naquele mar de todos os meses, que logo virará rio novamente, mas que não pode tocar os pés de ninguém.

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